no fim da vida.

Quando a vida quase acaba, percebes que bebes-te o mesmo whisky, todas as Sextas-Feiras. Que a garrafa não mudou, e que apenas as tuas mãos, mudaram o retracto, a imagem banal.

Esqueceste-te do quão singular és; e só o sabes, quando a vida quase acaba. 

Nesse dia, nesse dia onde começa a contagem decrescente para o teu fim, percebes que usas-te sempre as mesmas palavras. Que as cartas que envias-te foram escassas; que as que escreves-te não iriam caber, numa cómoda fria, de um coração que te esperou (toda esta vida).
Pouco vives-te mas, afirmas-te que sim. Os vinis foram sempre os mesmos; os que já não recordas. Aqueles, que te fizeram dançar, como entrega, ou, por instinto.
Quando sabes que não existirão mais Céus, recordas as Primaveras em jardins, com peitos cheios, e suspiros breves. Até lá, guardaste o Céu, onde guardas os sapatos de ballet – que nunca danças-te. A música clássica, que te esqueces-te de ouvir.

O retracto de uma vida, que sempre foi – que sempre foi vida. Pela falta de vontade – pela falta de amor-próprio. Culpar-te-ás, agora, que és a única coisa que te resta, dos lanches que fizeste para outros; que nunca chegaste a fazer para ti.

O gesto fraco de agradar – unicamente os outros. O teu peito, sozinho; não te abraças-te ao espelho, nem uma vez. Não contemplas-te o corpo que te pertence; não te deste prazer.
Quantas foram as vezes, que fazer amor te ocorreu – em noites frias, com lençóis retirados de um armário velho da casa de férias. Não existiam no entanto mais corpos, além do teu. Que nunca te pareceu suficiente.
Os livros ficarão nas prateleiras; e os quadros, continuam expostos nas galerias, que sempre te prometes-te visitar.

No fim da vida, será fácil entender, que o que faltou foi, amor: para ti. No final da vida, irás desejar mudar o whisky velho que bebes-te todas as Sextas-Feiras, e talvez, tenhas tempo de fazer amor contigo uma última vez. Desejarás, tê-lo descoberto sempre. Ter-te agradecido – enquanto única e singular; enquanto corpo quente que teu é – que apenas te pertence

No fim da vida, nada te restará – além das memórias de amor; amor que nunca te deste ao trabalho, de te dar.

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