Quando o fumo se alastra no espaço

O fumo alastrou-se no espaço, consórcio da imensa periculosidade que me acompanhava – sombras em slow motion; – entretanto alastrou-se dentro de mim. As luzes tomaram outro rumo e as mãos tocavam vagarosamente no nada que me pegava ao colo, fruto do fumo que se tornou vitrina dos meus olhos, véu das minhas palavras – reflexo de pequenos pedaços de mim – em bruto. Tornei-me partículas do ar que asfixiava todas as conclusões, pairei por aqui – num espaço suficientemente grande para que não existisse nenhuma forma de fugir. O fumo cegava-me os olhos – prendia-me a respiração e engolia-me as palavras. Retirou-me do asilo e levou-me até ao inconveniente, levou-me de mão dada até às portas dos outrora, fantasmas – o passado como eterno relevante; o passado como único protagonista possível nas histórias de quem (sobre)vive depois da perca da inocência e consequentemente, unicidade.
Sorri – disse algumas palavras agradáveis e retomei ao conforto da minha sobriedade. Ainda com a boca a saber a inconsciência, procurei-me na água que apenas reflectia algum comportamento premeditado – um adereço, apenas um adereço.

O corpo arde por dentro – explode da inconsciência pensada; segrega palavras imaginadas em sonos que não lembram a ninguém – cospe-as em forma de uma prosa chata que não fala sobre nenhum dos meus amores; uma prosa chata que não fala de nada a não ser sobre a falta de paciência para tomar consciência das necessidades de se ser grande – enorme e gigante – quando as estrelas não chegam; os abraços não são nada e a rua é um espaço arranjado para cheirar exactamente a nada. Quais recordações ou nostalgias? Os sorrisos são feitos de pedra; as mãos não beijam; e o espírito – o quente de se ser? Somos restos de pastilhas mascadas e atiradas para os pés de alguém.

Eventualmente, não seremos nada a não ser reminiscências em sapatos de desconhecidos; histórias anónimas de passagens; – só porque se estava no sítio certo à hora certa. Somos porque sim – e não existem retratos; não somos molduras eternizadas na cómoda de ninguém. Esboços de bonitos relatos de prados que nunca foram - além da imaginação de alguém - quando o fumo se alastra no espaço – e na mente; quando se deixa a consciência no chão em vez do espírito – depois as mãos já beijam. Quando o fumo se alastra no espaço – quando este é companhia de uma tarde que se parte delicadamente no ar. 

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