aves

Inalo cordialmente o pouco ar que me permites respirar; pertencente a outros corpos, a outro sexo, arranco de mim a ilusão de dar mundos – todos os mundos. Desfaço as malas no porto quase berço e entrego-me novamente às inúmeras possibilidades enquanto biliões. Faço de casa, um quarto rasca de um hotel numa cidade às escuras. Encontros marcados com leituras profundas e complexas, encontros não marcados – não, encontros. Corro descalça e fujo da cidade acolhedora de ti – colos distintos de realidades que se uniram, algum dia, por algum motivo. Entretanto vejo que passas – entretanto, lembro-te das oportunidades deixadas no chão de uma rua que nem te lembras qual. Uma qualquer – onde te perdes e te encontras, múltipla, nunca anónima – nunca inteira.

(Devias fugir das ruas que nunca te deixaram seres ave.)

Levo um cesto velho, com comida podre, vestida com um vestido rasgado e calçada de ti. Levo-me – arrasto-me. Deixo que o corpo tome controlo e para trás fica a consciência e o resto, o que me faz acreditar na pureza que é ser-se pessoa. O que me faz acreditar que um dia, o meu cheiro no teu vento; o meu toque no teu lar; as minhas palavras na tua tela – serão sinais de possibilidades projectadas num passado – lá longe.


Rápida esta passagem numa estação que não é minha, lá fora, calor que me arde os olhos e não me deixa ver as razões – as variáveis. Não sei o que procuras; as ruas cheias de ti nas vozes que nunca serão a tua, dão-me retratos emoldurados de sorrisos registados nos olhos – de planos pensados em madrugadas a ponderar o nascer do Sol – mas não a querer-lo. Desperdiçar esta coisa de abraçar palavras e querer momentos; seres pessoa no meio da minha multidão – rosto reflectido nos outros que passam nas ruas em que te imagino; em que te pinto. Por agora, está tudo bem – mas se descobrires que para onde viajo, queres ser poesia, não contes a ninguém. As pessoas não vão compreender que gostar tem destas coisas – rasteiras, empurrões, decisões difíceis – e tu não vais compreender o por quê de não teres ficado; de não teres sido título de uma bonita navegação e não protagonista do teu próprio naufrágio. 

("don't ever touch a raptor" -  I already touched you.)

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