Fomos rastos no céu.
- Quantos metros tem esse precipício
onde vives? –
Observei a rocha que se erguia ao longo do céu, do tamanho de um
monstro, do tamanho de uma morte certa. Equilibravas-te delicadamente no fio de
vida que se apresentava entre a rocha e o nada; uma adrenalina que ultrapassava
o gosto de ter um coração nas mãos. Ia engolindo em seco enquanto te olhava,
majestosa – enquanto queria ser salvação possível para o presumível pé em
falso. Mandava calar a água, em silêncio – pedia que não batesse tanto, que não
fosse banda sonora de um desastre, que não fosse melodia para uma tentativa
falhada de ter mais do que o que é possível; ser mais do que o que é possível.
Pestanejava devagar, com medo que
este fosse um gesto brusco o suficiente para te fazer cair; mantive toda uma
postura gélida, mantive-me correcta – empenhada em convencer-te a não viveres
mais com a necessidade do medo; uma constante – uma adrenalina que não acabava;
escolhas com base na tragédia. Um medo que se transforma em reforços para as
atitudes não pensadas, não calculadas – as atitudes que alimentam a maratona
que se passa nas tuas veias. A exaustão. (Posso
ser o teu trampolim?)
Disseste qualquer coisa entre
esses lábios – esses lábios que me
protagonizam as insónias. Disseste qualquer coisa até desistires do quase equilíbrio
que te balançava a vida. Enquanto caías e eu perdia as forças nas pernas –
abriste as asas, num gesto imaginado num bailado; poesia de óperas. Respiras-te;
e respondes-te:
- Tem tantos metros quanto eu;
tem tantos metros quantos os que posso voar. – E fomos; rastos no céu.
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