quietude
Desconsertos que se criam de cada
vez que existe uma entrega presumível a um arrependimento ao fim do dia. Pior
do que esses vínculos passageiros, meios idiotas, é quando existe um
desconcerto criado pela entrega ao suposto sem que exista um arrependimento
escrito nas insónias que nos invadem, que nos rompem a alma. Depois os dias são
feitos de pedaços de memórias, vai-se construindo um presente baseado nos
sorrisos genuínos, presentes em fins de tarde. Esquece-se o que existe para ser
esboçado nos rascunhos espalhados na desarrumação de uma vida. Os chás
arrefecem e as almofadas são companhia de si mesmas. O amargo sabor à tua
camomila azeda-me a capacidade de avançar, presa a uma definição de gostar e desequilibrada
sobre os conceitos que criámos enquanto nossos. É por isto que as pessoas vivem
de motivações alheias; de paixões de outros – os que beberam frio, o veneno do
querer – amaldiçoadas pela praga que é querer mais que a própria vida, cuspiram
restos de si em músicas, em livros, em quadros – em ruas vazias de coragem para
a entrega. Óbvio que este é o mais recorrente suicídio – quando as armas estão
tão próximas de nós, quando os poemas são assassínios e a música nos destrói a
capacidade de erguer a cabeça em direcção ao astro mestre. Arrasto-me em direcção
à imensidão da noite, sou breves passagens que te suspiram aos ouvidos. Somos
surtos inevitáveis, quando os caminhos certos se cruzam. Somos anónimas –
pensamentos rápidos de dias quentes, que não atenuam em nada este veneno que me
injectaste directamente no peito. Acho que me falha a respiração, intervalada
com o excesso de ar que me cospes. Desconsertos óbvios quando os extremos
opostos da vida decidem compor uma só cena – paradoxos destrutivos para o meu
descanso a longo prazo. Carrego-te nos ombros, por querer que fiques por
inteiro. Por querer que me vejas chegar no elefante mais soberbo; por querer
ver os teus olhos brilharem como o fogo-de-artifício que nos havia de protagonizar
o resto das vidas. (recuo três passos e fico sossegada, numa quietude típica de
mim.)
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