Confrontos
Não consigo datar precisamente desde quando te vejo vestida com essa
camisola de lã que te aquece. Sei que tens fugido deste Inverno como quem foge
da morte; sei que tens escapado às espadas e paredes como quem escapa da vida.
Não consigo datar com precisão desde quando me enches as mãos de sorrisos e
ofereço-te em Praça Pública enquanto pílula da felicidade – enquanto teatro dos
corações e milagre para o amar incondicional. Recordo-me desse andar delicado
de quem entra matreiramente no meu quarto – no meu mundo, a tocar piano
suavemente. Danças um bailado e transformas-te em magia perfeita – transformas-me
em pequena colheita que te manterá toda a estação longe das ruas geladas.
Como oito e oitentas assim constróis a marioneta que te entretém – a
que vais dedicar a possibilidade de desenrolar. Somos enredos repensados quando
já não fazia sentido amar – desenlaces programados para a capacidade de
incentivar quem prefere não se entregar.
Não consigo datar precisamente desde quando te vejo só vestida com essa
camisola de lã que te aquece – mas sei datar com precisão que é o meu quente
todos estes dias frios. Só sei datar com precisão que – a tua dança me encanta –
só te sei ver nesse musical, enquanto choro de orgulho por seres um palco
iluminado – e por iluminares também a minha vida. Hoje és a música clássica dos
meus ouvidos – somos este perfeito enredo de um bailado delicado, em que se
entra no palco silenciosamente e se permanece perante o foco e perante uma
multidão injusta que não nos sabe ler – que não sabe o que é ser o teu par
nesta dança infinita d’amor.
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