desafinação.
As mesas estavam sujas - especialmente sujas - nas noites em que as crianças nos invadiam a vida e a responsabilidade se escondia, tímida, nos quartos trancados. Sujas de líquidos que achávamos ser impulsionadores da vida eterna. Da beleza eterna. Da juventude eterna. Mas não. Sujas de palavras e de pessoas que nada têm além da esquina alheia. De janelas entreabertas. De portas mal fechadas. De segredos mal escondidos. E sujos (nós) tornávamos a pocilga em adjetivos bonitos e promessas impenetráveis. Acho que foi aqui que me perdi, por decisão minha, coerências mal disciplinadas mas culpa minha - e que os rumos se tornaram dispersos e os vasos de jardins bonitos secaram diante dos meus pés.
As mesas estavam sujas - exclusivamente de sentimentos sujos - de abraços mal dados e conversas por terminar. Sujas de comidas impuras e de sorrisos forçados. Era genuinamente sincera - nunca se foi genuinamente sincero. Mas o tempo - murmúrios - ai o tempo. O mestre.
(As Mulheres não choram) - Leva-me; traz-me. Volta amanhã - aqui estamos, de novo. Na minha cabeça. Pinturas na minha cabeça. E se fosse um de nós? Sem autoestima. Sem maquilhagens que enfeitam os rostos (e a alma?). Demasiado tarde para arrependimentos - perdões. É agora - ou nunca. Sem maquilhagens que enfeitam os rostos (e a alma?) poker faces.
Hora de despedidas - do adeus previamente ensaiado e só agora digerido. Ditaduras impostas por quem sempre se manifestou enquanto revolução. Ficam os lábios nos copos das mesas sujas; as conversas fáceis de corpos que dificilmente caminham - só se arrastam. Só deslizam. Pinturas de ti. De mim. Em paredes com vista para o mundo - com o mundo virado para elas. Arrependimentos de uma criança lúcida que entrou no Universo alheio e que fugiu - descalça - vencida. No fundo, se houve algo que aprendi nas noites vastas, vagas e baças - foi que os reflexos de cada um são transcritos em línguas difíceis de traduzir nas casas d'Alguém. O que vos resta - a capacidade de disfarçar frases rápidas e fáceis - de simpatias delinquentes. O que me resta - teorias da marginalização empregues no formato genuíno que decidi adoptar - em vez de um bom eyeliner.
Comentários