Desabafos de quem emigra
Tenho percebido que me enche o coração a ideia de ter em breve pessoas que amo - que são minhas melhores amigas - a vir morar para Londres. No meio da agitação do meu coração, ignoro o óbvio. Custa. Custa muito. Como já passei por todo o processo de afastamento e a mim já não me dói, anulo a dor de outrxs com a minha exaltação. Faço planos e coisas bonitas. Jantares cheios das "minhas" pessoas. Vou ter colos para chorar, mais colos para chorar. As minhas tardes vazias podem ser preenchidas com cafés ou serões a ver filmes com as pessoas que sempre respeitaram o que sou. Que me conhecem e sobretudo me deixam ser genuína. Aquilo que deixei - em parte - vem até mim. Isso enche-me o peito. Um pequeno Portugal selectivo e onde a selectividade parte por ser exactamente quem me faz falta além da minha família e mais umas quantas pessoas. Falta ao corpo. Ao espírito. Existem outras pessoas. Novas pessoas. Mas ninguém é substituível. Por isso é que o meu coração, de forma ignorante e ingênua, afasta o fundamental - a decisão dx outrx (e que decisão!). Estou aqui há 8 meses e já me sinto privilegiada em ter algué(ns) a caminho. Mas de onde vem a decisão? Onde nascem as motivações? Parei a minha tarde para ouvir um choro e um desabafo de quem vem. Foi tão familiar que me fez reviver cada pedacinho da dor de quando eu também vim. Senti que era egoísmo fazer deste assunto única e exclusivamente uma celebração. Alguém que vem para estudar. Alguém que vem para trabalhar. Alguém que vem para procurar trabalho. Alguém que pode mesmo vir, só para se encontrar. São pessoas - que eu amo, genuinamente - com quem partilhei coisas bonitas e a quem confiei coisas enormes, que têm que vir. Não é só o limiar da pobreza que pede uma alternativa. É também a ambição e a projecção. Os objectivos e as realizações pessoais e/ou profissionais que não são encontradas em pleno na vida actual. No país actual. Não sou ninguém - nem ningu(éns) - para falar do que motiva outrxs. Sei que o mundo é de todxs e essa coisa dos nomes dos países é uma barreira para mudar. Mas não são só os nomes. São as famílias e a comida. Os cheiros e as cores. Os hábitos. O conforto e a sensação de segurança. Só sei que vou ajudar sempre que conseguir. Que vou estar aqui quando fazer as malas e regressar parecer a única opção - ou então, fazer as malas em conjunto e ir até outros ares. Respirar coisas diferentes. Só sei que não é justo esquecer que tomar tamanha decisão dói. É indescritível. Sei que dói mais o planear e tornar real do que o depois. Mas dói. Acalmei os ânimos. O meu coração continua cheio e a sentir-se feliz mas também sente que é importante compreender que alguma coisa não está bem para que eu possa ser uma pessoa privilegiada, ao ter as pessoas que amo a chegar a outro mundo. E que um bocadinho de mim sabe que, mais valia elas não terem que vir.
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